As nossas sociedades estão sob um violento ataque do capitalismo argentário, sem escrúpulos nem rosto. A única resposta séria é política -- que não se verificou por vários motivos, entre os quais a fraqueza das lideranças europeias (Merkel, Sarkozy, Berlusconi, por razões diferentes) e os interesses divergentes do país de Cameron, a outra grande potência da UE.
Neste contexto, em que os países periféricos (ou não) procuraram passar por esta crise como por entre os pingos da chuva, abdicando de se concertarem, ganhando algum músculo político, remetendo-se a um isolamento receoso do contágio da lepra grega -- neste contexto Portugal não risca nada, é irrelevante.
Bem podemos nós vociferar e ir para a rua -- e devemos fazê-lo, apesar de tudo -- que o governo, acolitado por boa parte do PS, toma as medidas que lhe dá na gana. E não é uma greve geral realizada em mês de subsídio de Natal que o vai demover, tanto mais, que o PC e o BE tiveram uma votação residual, e as ordeiras e «enquadradas» manifs do PC e da Inter não assustam ninguém. Logo, no nosso isolamento europeu e na fraqueza da esquerda contestatária, estamos nas mãos dos interesses financeiros, interpretados domesticamente por um alienígena leve e fresco como o ministro da Economia ou por um contabilista de cálculo indiferenciado como o ministro das Finanças.
A decisão, difícil, da UGT, do tipo vão-se os anéis mas fiquem os dedos, talvez tenha sido, apesar de tudo, a menos prejudicial para quem trabalha. Concedo que a CGTP não poderia nunca ter assinado aquele acordo, mas como daí não retirará as ilações que se imporiam -- contestação a sério na rua, como o fizeram os gregos (sem resultados, na sua solidão, reconheça-se...), o mais que tem a fazer é: ou vir a terreiro, levantar barricadas e passar ao ataque -- ou, na sua impotência, não vir com o insultozinho fácil e miserável a João Proença, que teve mais dignidade naquela assinatura do que alguns sindicalistas profissionais cheios de garganta -- e só garganta -- que ontem se passearam até São Bento.