letras, sons, imagens -- revolução & conservação -- ironia & sarcasmo -- humor mau e bom -- continua preguiçoso
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Jul 05
publicado por RAA, às 23:47link do post | comentar
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publicado por RAA, às 23:43link do post | comentar
CONSOLO NA PRAIA

Vamos, não chores...
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.

O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.

Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis casa, navio, terra.
Mas tens um cão.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?

A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-te -- de vez -- nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.

A Rosa do Povo / 65 Anos de Poesia

(edição de Arnaldo Saraiva)

publicado por RAA, às 23:33link do post | comentar
Os novos habitantes do Paraíso foram descendo, em friso, a prancha que ligava o cais ao navio. Alguns adequavam motejo ao receio dos outros, quando eles estendiam o braço para o companheiro da frente, em solidariedade pueril de caminhantes em corda bamba.
Lá dentro, como se aproximassem da escotilha quando uma lingada descia, o mestre fê-los deter com voz rude e imperiosa. Quedaram-se um momento hesitantes, depois rumaram para a esquerda, seguindo Alberto, que ali descobrira refúgio.
O convés, ao contrário do de cima, era húmido, sujo e escorregadio. Dir-se-ia que visco fluido e repulsivo se exalava de toda a parte, estendendo-se sobre a pele, furando até os poros.
-- Fiquem aqui, que logo que o vapor acabe de carregar se armam as redes -- disse Balbino, antes de subir para instalar-se na primeira classe.
Estavam ali já outros tabaréus ignaros, gente destinada a vários seringais do Madeira, lá longe, onde o mistério insinuava bom futuro. Alguns levavam as mulheres e os filhos e, mesmo antes de aninhar-se, davam sensação de promiscuidade -- farraparia, miséria errante, expressões mortiças de sofredores.
Cap. II, 32ª ed., pp. 42-43.

publicado por RAA, às 17:47link do post | comentar
escreve Pacheco Pereira na edição de hoje do «Público», a propósito dos acontecimentos de Londres. E eu, eu concordo... Com pena, pois, se ainda me lembro, o articulista foi um dos apoiantes da investida contra o Iraque, com lindos resultados, o que, aceitemos, não lhe retira o acerto da análise, ao contrário de Soares, que esteve do lado correcto, mas espalhando-se ao comprido nos últimos comentários, sobre umas famigeradas causas, que como já aqui escrevi, só lateralmente têm que ver com o que se passou. Defendamo-nos, pois, com tudo o que temos à mão, como diz Pacheco Pereira: «tropas, polícias, agentes de informações, à dentada (...)», se for preciso. É brutalmente simples, reconhece, mas não deixa de ser realista. Ao contrário, Helder Macedo, pessoa, escritor e intelectual respeitabilíssimo, também hoje na «Visão», http://www.visaoonline.pt/, parece-me que incorre nos erros de apreciação do costume, ao avisar-nos, com legítima preocupação, em relação aos excessos, em particular dos demagogos e duma tropa fandanga que lhes está adjacente. Tolerância, democracia, está tudo muito bem, creio que os ingleses serão os últimos a cair em tentações estranhas. Não lhes peçam, porém, que se deixem imolar. Ou somos intolerantes com a intolerância ou, aí sim, capitularemos.

publicado por RAA, às 15:13link do post | comentar
Ao farfalhar do patriotismo, venha do Norte ou do Sul, da Europa ou da América, sobrepõe-se sempre no meu espírito uma causa mais forte, uma razão maior: a da Humanidade.

Do «Pórtico», 1ª edição

publicado por RAA, às 02:43link do post | comentar
Eu devia êste livro a essa Amazonia longínqua e enigmática, pelo muito que fez sofrer os primeiros anos da minha adolescência e pela coragem que me deu para o resto da vida. E devia-o, sobretudo, aos anónimos desbravadores, gente humilde que me antecedeu ou acompanhou na brenha, gente sem crónica definitiva, que à extracção da borracha entrega a sua fome, a sua liberdade e a sua existência. Livro bárbaro, como a vida que enquadra, como o scenário que lhe serve de fundo, êle completa em muitos pontos, à margem do entrecho, o meu romance «Emigrantes».
Num, a paísagem ridente do sul do Brasil; noutro a paísagem magestosa do Norte. Em «Emigrantes», o exílio pelo estômago; neste, o destêrro pelo espírito. E nos dois, a uni-los indissoluvelmente, a luta pela vida, a conquista do pão, a miragem do oiro -- um oiro negro que é miséria, sofrimento e quimera com que os pobres se enganam. (...)
Do «Pórtico», 1ª edição
Nota: as naturais referências aos seringueiros, «à gente sem crónica definitiva», objecto das preocupações sociais do autor. A conquista do pão é um dos mais conhecidos e importantes livros do príncipe Piotr Kropótkin, uma das grandes figuras da história do anarquismo, influência decisiva em Ferreira de Castro, sobre quem, de resto, projectou escrever uma biografia, nos anos 30, a pedido do poeta brasileiro Martins Fontes, um devoto do libertário russo.

publicado por RAA, às 01:58link do post | comentar
Entre 28 e 31 deste mês irá decorrer em Oliveira de Azeméis um congresso internacional sobre este livro magnífico de Ferreira de Castro. Participarei com uma comunicação sobre as ideias anarquistas do escritor. Até lá, postarei passagens do romance susceptíveis de serem trabalhadas por esse prisma, com eventuais comentários ou anotações. As edições utilizadas serão a 1ª, da Livraria Civilização, Porto, 1930 e a 32ª, de Guimarães & Cª. Editores, Lisboa, 1980.

publicado por RAA, às 01:52link do post | comentar | ver comentários (2)
Posted by PicasaCapa de Bernardo Marques
Livraria Civilização,
Porto, 1930

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