letras, sons, imagens -- revolução & conservação -- ironia & sarcasmo -- humor mau e bom -- continua preguiçoso
04
Jan 07
publicado por RAA, às 19:37link do post | comentar | ver comentários (2)


03
Jan 07
publicado por RAA, às 22:56link do post | comentar
Gaspar Simões
Na «beleza emotiva» (19) procurada pelos poetas da presença não havia também lugar para o formalismo, para a habilidade dos vates de academia, para o tecnicismo, espartilho de muito razoável poeta que dele não logrou libertar-se. E se para Gaspar Simões -- o mais assertivo dos teóricos presencistas, cujas tiradas terão contribuído o seu quê para dar da revista a imagem duma certa irredutibilidade («a história da arte é a história da luta dos artistas com a realidade exterior» (20)), não se seguia -- pelo menos para os restantes co-directores -- que o artista se devesse encasular, umbilicalizar, torredemarfinizar. A poesia-pura, na acepção de Casais, rejeitando a submissão à forma e às escolas, não se afastava dos grandes problemas do homem -- fazia-o, porém, apenas «como expressão directa do seu debate interior.» (21)
(19) Helmut SIEPMANN, «Aspectos da poesia do segundo modernismo português», Revista da Faculdade de Letras, 5.ª série, n.º 16-17, Lisboa, Universidade de Lisboa, 1994, p. 278.
(20) João Gaspar SIMÕES, «A arte e a realidade», presença, n.º 36, Coimbra, Novembro de 1932, p. 6.
(21) Adolfo Casais MONTEIRO, «Mais além da poesia pura», presença, n.º 28, Coimbra, Agosto-Outubro de 1930, p. 7.
(continua)

publicado por RAA, às 19:56link do post | comentar


02
Jan 07
publicado por RAA, às 23:17link do post | comentar | ver comentários (2)

Amo com esta saudade
que me corrói.
Amo cada vez mais doído.
A boca fechada sobre as ervas
há tanto tempo.
Os braços a descansar
no pântano do ventre.
A saudade enxuga-me o fogo
longe do mundo.
A saudade torna-me verde.
Tenho no rosto
aquela parte negra do branco.
A vida toda encostada à lembrança
com a comoção das origens
a soluçar-me
instante a instante
na garganta.
Os ossos
neste Inverno da vida
com a noite da saudade por cima.
Brilha nessa escuridão o passado.
Cresce no frio um caule de luz.
Dissolvo pouco a pouco
a sede baça da morte.
Transfiguro-me perplexo.
A saudade seca-me a tristeza.
Cede-me ao céu
e aos raios da sua alegria.
Enxuga-me a mágoa.
Cresce-me no meio do corpo uma flor.
É uma flor matinal
de anil
rebentando por entre as vértebras.
Brilham-me no ser
os braços irradiantes de uma estrela.
A saudade coa-me no sangue um astro.
O meu corpo
é a raiz sombria de um outro sol.

O Poeta na Rua


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publicado por RAA, às 22:42link do post | comentar


01
Jan 07
publicado por RAA, às 18:55link do post | comentar | ver comentários (2)

A beleza sim mais uma vez / Não por adorno mas instinto fundo

Alberto de Lacerda

publicado por RAA, às 18:02link do post | comentar
«Nunca será inútil repetir que o que mais interessa numa obra de Arte... é a própria obra de Arte.» (12) Era o primado da arte que Régio defendia nesta sentença; ou como claramente, por outras e mais contundentes palavras, advertiria Casais Monteiro, a propósito da presença: «aqui não se servem causas: faz-se e trata-se de literatura e de arte.» (13) Por demais óbvias que estas posições pareçam, deve, no entanto, dizer-se que eram formuladas num contexto de hegemonia (de poder efectivo ou de influência na acção) de sectores não complacentes com a ideia de a expresão artística dever estar isenta de qualquer subordinação. Afirmações de independência que remetiam o autor presencista para as margens da oficialização cultural do Estado Novo, com uma política nacionalista e de tentativa de domesticação dos intelectuais, afastando-o também do neo-realismo oficial, emergente em meados da década de trinta. Seria, contudo, demasiado simplista e pouco rigoroso inferir que a publicação rejeitasse qualquer manifestação artística de tendência, quer «ascendente» ou «emancipadora» (para empregar termos de Plekhanov, posteriormente vulgarizados pela teorização neo-realista (15)) quer o seu oposto, alinhadamente reaccionária:
«Sim, a presença defende a arte pela arte, mas a arte pela arte da presença nada tem com o "egoísmo da torre de marfim do esteta ante o incêndio do vizinho ali defronte." A presença tem sido, nesse capítulo, ora muito mal compreendida, ora muito desconhecida, ora muito caluniada. Contra o que a presença luta e lutará, é contra as opressões que, ou dos lados da Alemanha e Itália ou dos da Rússia, pesam sobre a livre consciência do artista. A presença não admite que se imponham temas, estilos, modelos, opiniões, preocupações a um artista. Faça cada um o que melhor sabe, pode, quer -- e fará o melhor possível. Eis o que diz a presença, revoltando-se contra os excessos dos nazis e dos comunistas.» (16)
Toda a vida andou o poeta do Cântico Negro a afirmar que a arte podia ser tudo, desde que fosse arte, isto é, genuína, sincera, autêntica -- viva, numa palavra. Podia inclusive ser obra de propaganda: não se lhe recusaria uma categoria superior (17), desde que cumprisse o que devia ser a sua finalidade última: a «emoção estética». (18)

 

(12) José RÉGIO, «Uma peça de Pirandello (sei personaggi in cerca de auctore)», presença, n.º 7, Coimbra, 8 de Novembro de 1927, p. 7.

(13) Adolfo Casais MONTEIRO, «Nós, os porta-vozes de uma estética subjectiva até à desumanização...» [s. d.], O que Foi e o que Não Foi o Movimento da Presença, p. 31.

(14) Ver Jorge Ramos do Ó, «Salazarismo e cultura», in Joel SERRÃO e A. H. de Oliveira MARQUES, Nova História de Portugal, vol. XII, Fernando ROSAS (coord.), Portugal e o Estado Novo (1930-1960), Lisboa, Editorial Presença, 1992, p. 409.

(15) «[...] o talento de qualquer verdadeiro artista é grandemente reforçado se for penetrado pelas grandes ideias emancipadoras do nosso tempo.» PLEKHANOV, A Arte e a Vida Social, trad. de Ana Maria Rabaça, Lisboa, Moraes Editoes, 1977, p. 72.

(16) José RÉGIO, carta a Roberto Nobre, Portalegre, Junho de 1936, Boletim, n.º 4-5, Vila do Conde, Câmara Municipal / Centro de Estudos Regianos, 1999, pp. 31-32.

(17) A propósito de A Revolução de Maio, de António lopes Ribeiro, o director da revista escreveu: «A propaganda e a arte podem não ser inimigas. Basta que profundamente se conjuguem na obra realizada a crença numa doutrina e a emoção artística.» José RÉGIO, «Cinema português», presença, n.º 50, Coimbra, Dezembro de 1937, p. 12.

(18) José RÉGIO, «Literatura livresca e literatura viva», presença, n. 9, Coimbra, 9 de Fevereiro de 1928, p. 1.

(continua)

 



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