Bruxelas, 1.º de Março de 1902
7, rue Zinner
Meu caro Batalha
Você não respondeu à minha carta pedindo-lhe conta dos seus fornecimentos à Gazeta, sem dúvida por não ter tido tempo de descobri-la entre a sua imensa papelada. Não suponho que a sua conferência sobre V. H.* lhe tenha tomado mais tempo do que o necessário para escrevê-la (tive um [?] que facilitava assim estas coisas da escrita). Pela notícia demasiado resumida do Daily Chronicle vi que V. coloca o maior lírico dos tempos todos acima de Shakespeare e de Goethe. Hombre!... Não imagina o gosto que tive em vê-lo assim diante de Ingleses como aos vinte anos diante da Opinião. Se vivesse o nosso pobre Queiroz escrevia-lhe decerto uma carta de quarenta páginas, à pena solta.
Sabe que só agora li o Ramires? E com que ternura acompanhei a formação daquela figura e o processo da escrita, descobri movendo-se por entre as almas tipos, a alma do nosso saudoso amigo. Notou V. como nos seus últimos livros entra a paisagem como elemento de emoção, a paisagem como fisionomia e expressão? Foi depois que ele inventou os adjectivos abstractivos e morais, subjectivos, para as coisas sem alma, a que ele emprestava a sua imaginativa. Dez anos mais e saúde, e o Queiroz romperia as barreiras da língua portuguesa, poeta de peregrina inspiração, ainda mais do que artista, que era o que ele queria ser...
Tinha muita coisa para lhe dizer e de repente secou-se-me tudo. Interrompi-me para receber uma visita, que me ensurdeceu. Fica para outra vez.
Escreva-me. Dê as minhas saudades aos seus e receba um abraço do seu amigo do coração
Domício
In Beatriz Berrini, Brasil e Portugal: a Geração de 70
*Victor Hugo