108, Boulevard Berthier, Paris, 17e
13 de Dezembro [1929]
Meu presado Amigo
Remeto-lhe por êste correio a tradução das Ultimas Conversações do Renouvier. Ficar-lhe-ia muito grato se me encarregasse de mais trabalhos dêste género. A minha situação financeira é neste momento dificílima.
Parece-me tipograficamente mais belo colocar as anotações juntas, no fim do volume, e assim fiz; se não concorda, o remédio é fácil: basta dizer ao tipógrafo que as introduza no texto.
Procurei tornar a tradução mais clara do que o original.
Na Lauda 52, resolvi-me a criar uma palavra: percepcionar, -- para tradução de percevoir, ter percepção, porque perceber tem na nossa língua uma acepção vulgar que é bem diferente*. Parecia-me conveniente reunirmo-nos um dia algum amigos da filosofia, para fixarmos certos pontos de vocabulário filosófico em nossa língua. Há vinte anos quando escrevi a Natureza da afecção, tive de forjar essa mesma afecção. Agora, que decidiu publicar uma biblioteca filosófica, era boa ocasião de fixarmos o vocabulário, para não ficar muito diferente de volume para volume.
Parecia-me conveniente dar à colecção um título, que se imprimiria como sôbre-título em todos os volumes, os quais suponho conviria tivessem um aspecto tipográfico uniforme.
Nas provas poderei ainda fazer quaisquer aperfeiçoamentos.
Parecia-me também interessante levar cada volume um pequeno introito explicativo seu, como director da colecção.
Seus cunhados bem. Um grande abraço do Amigo muito dedicado, grato e admirador
A. S.
*Ver a anotação respectiva, na Lauda 108
António Sérgio no Exílio -- Cartas a Joaquim de Carvalho
(edição de Fernando Catroga e Aurélio Veloso)