O recente centenário do nascimento de Lopes-Graça fez-me ir à gaveta retirar um estudo com meia dúzia de anos destinado a uma colectânea de correspondência com os «presencistas», grupo a que, por direito próprio, o autor de Música e Músicos Modernos pertence. Ele aqui fica, em primeira mão. Liberdade de criação e expressão, recusa de subordinação a tudo que não fosse a verdade do artista, consequente afirmação da sua independência em face dos poderes instituídos -- condição necessária para a autenticidade da criação como manifestação do que de mais genuinamente o artista traz em si --, rejeição do academismo, do formalismo e da contrafacção: este, a traços largos, o programa da presença, revista literária que se publicou em Coimbra, entre 1927 e 1938, com uma segunda série saída em Lisboa, em 1939 e 1940.
Com a Seara Nova, de Raul Proença, Jaime Cortesão, Câmara Reis e António Sérgio, entre outros, iniciada em 1922 -- embora não descurando a literatura, procurava antes de tudo exercer um pedagogismo cívico que não cabia nos propósitos da folha coimbrã --, apresentam-se-nos ambas como as principais referências éticas da vida cultural portuguesa, no que a revistas culturais respeita, entre as duas guerras mundiais. Não por acaso, de resto, se constata a preeminência de ambas, cujas afinidades na respectiva área de intervenção teríamos gosto em explorar, não fosse tal confronto comprometer a razoabilidade das dimensões da apresentação deste epistolário. (1)
(1) Recorde-se a funda admiração que Régio consagrou a António Sérgio, e também a sua importante colaboração na Seara, com destaque para as «Cartas do nosso tempo», dadas à estampa na década de 30 (ver Isabel Cadete NOVAIS, «Colaboração de José Régio em publicações periódicas», Boletim, n.º 2, Vila do Conde, Câmara Municipal / Centro de Estudos Regianos, 1998, p. 5.)
(continua)